sexta-feira, 3 de novembro de 2006

Agonia


"(...) Mas na realidade não sei ainda se quero que te vás ou fiques, é tão difícil saber. Porque num caso ou noutro agonizo. Mas como sabes há um outro de nós que escolhe quando é de ser, mesmo contra o que julgamos querer. Assim, hoje ao acordar fiquei aterrado ao ver que de noite me rolara para o meio da cama. Deitei-me como sempre do meu lado, para deixar livre o teu no caso de resolveres voltar e te deitares nele. Mas o sono levou-me para o sítio que é o bom e fica à minha esquerda. Porque é que eu me passei para o meio da cama? e só acho uma como resposta o teres morrido para sempre. E fiquei horrorizado da minha libertação. Não vás ainda. Volta de novo. Vou deitar-me outra vez no meu lugar e deixar o teu à espera. Vem de noite sem eu dar conta e acordar contigo ainda no teu sono e tocar-te e seres tu. (...)"
Vergílio Ferreira, in 'Cartas a Sandra'

1 comentário:

Anónimo disse...

Não imagina a surpresa, e a alegria (nem acredito que utilizo esta palavra associada a este texto!) ao encontrar este excerto aqui. Como diz no meu blog, é para mim o texto mais bonito sobre o amor. Nenhum outro, nenhum poema, nenhuma palavra, consegue alcançar, transmitir o que é o amor, como este texto. E neste caso, através da ausência dele...Que é sempre o que dói mais.

Definitivamente, passarei mais vezes.

Beijo