sábado, 24 de janeiro de 2009

As mãos como os meus dias

"Quando veio,
Mostrou-me as mãos vazias,
As mãos como os meus dias,
Tão leves e banais.
E pediu-me
Que lhe levasse o medo,
Eu disse-lhe um segredo:
«Não partas nunca mais»
E dançou,
Rodou no chão molhado,
Num beijo apertado
De barco contra o cais.
E uma asa voa
A cada beijo teu,
Esta noite
Sou dono do céu,
E eu não sei quem te perdeu.
Abraçou-me
Como se abraça o tempo,
A vida num momento
Em gestos nunca iguais.
E parou,
Cantou contra o meu peito,
Num beijo imperfeito
Roubado nos umbrais.
E partiu,
Sem me dizer o nome,
Levando-me o perfume
De tantas noites mais.
E uma asa voa
A cada beijo teu,
Esta noite
Sou dono do céu,


E eu não sei quem te perdeu."



Pedro Abrunhosa por Margarida Guerreiro

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Pesa-me tudo menos a dor

"Pesa-me, inteira, a flor que falta
Para a roseira ficar mais alta.
Pesa-me a Lua! E a noite vem,
De espada nua, buscar alguém…
Pesa-me a neve. Ou a montanha?
Dizem que é leve. Mas, é tamanha!
Chumbo ou veludo. Seja o que for!
Pesa-me tudo menos a dor."

Pedro Homem de Mello

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Esta visão de ausência e interrogação


Olho pela janela e percebo que o Tejo se confunde com o céu. O nevoeiro esconde a outra margem e esta visão de ausência e interrogação remete-me para outras paisagens, mais quentes, mais distantes, mais coloridas, mais confusas. Regressei há oito dias a Lisboa. Na boca tenho ainda o sabor dos teus beijos. No coração, a cinza de um amor que não pode arder. Tenho as mãos vazias e sei que muito em breve deixarei de saber como é o calor do teu toque. Não há derrotas nem perdas: apenas a certeza de que há vidas que se tocam. Nada será diferente daqui para a frente. Encontro na tua ausência formas de te perpetuar. Não te amo mas desejo-te. E trago no sorriso a certeza de que, por breves instantes, fui feliz ao teu lado.

domingo, 4 de janeiro de 2009

A paz de um amor tranquilo


E hoje estou assim, neste limbo entre o cinzento e o azul, neste corpo de saudade e ausência, neste intervalo entre a dor e o riso, neste conflito entre o sentir-me um viajante e um desterrado, nesta distância entre o desconhecido e a descoberta. E depois há o pensar que devo afastar de mim os pensamentos menos felizes para viver em pleno esta experiência de viagem. Mas há também a certeza de que estes períodos de longo afastamento voluntário só fazem sentido porque volto para os braços (e abraços) dos que diariamente viajam comigo nos olhos e no coração.
(E depois existe essa breve vertigem da noite de fim de ano quando, aqui tão longe (meu Deus, aqui tão longe) encontrei e amei outro olhar, de cor diferente, de língua diferente, de calor e toque diferentes mas de entrega tão igual. E essa presença persiste em me acompanhar agora, com uma força e uma intensidade que não podem existir nem fazem sentido. E conto os dias para a rever, nem que seja por uma última vez, desta vez enquanto não existem outras vezes, do outro lado do Atlântico onde vive. E assim, separados por tantos oceanos diferentes, descubro que apenas sei amar o impossível e que não existe para mim a paz de um amor tranquilo.)