quinta-feira, 31 de julho de 2008

Que llores y te humilles ánte ése gran amor



"Y tú que te creías el rey de todo el mundo
Y tú que nunca fuiste capáz de perdonar.
Y cruél y despiadado, de todo te reías
Hoy imploras cariño aunque sea por piedad.

A dónde está tu orgullo, a dónde está el coraje?
Porque hoy que estás vencido mendigas caridad
Ya vés que no es lo mismo amar que ser amado
Hoy que estás acabado que lástima me das.

Maldito corazón, me alegro que ahora sufras
Que llores y te humilles ánte ése gran amor.

La vida es la ruleta en que apostamos todos
Y a tí te había tocado no más la de ganar.
Pero hoy tu buena suerte la espalda te ha volteado
Fallaste corazón, no vuelvas a apostar."

Cuco Sanchez, por Amália Rodrigues

quarta-feira, 30 de julho de 2008

O silêncio que antecede a madrugada


"Queria ser essa noite que te envolve;
e cobrir-te com o peso obscuro
dos braços que não se vêem.
Um murmúrio desceria de uma vegetação de palavras,
enrolando-se nos teus cabelos como
secretas folhas de hera,
num horizonte de pálpebras.
Deixarias que te olhasse o fundo dos olhos,
onde brilha a imagem do amor.
E sinto os teus dedos soltarem-se da sombra,
pedindo o silêncio que antecede a madrugada."


Nuno Júdice

terça-feira, 29 de julho de 2008

Y en vez de amarte menos, te quiero mucho más!


"Primavera de mis veinte años,
Relicario de mi juventud,
Un cariño feliz yo soñaba
Y estoy sola con mi esclavitud.

Quisiera amarte menos,
No verte más quisiera,
Salvarme de esta hoguera,
Que no puedo resistir.
Es cruel este cariño
Que no me da descanso,
Sin ti la paz no alcanzo
Y lejos no se vivir.
Quisiera amarte menos,
Porque esta vida ya no es vida,
Mi vida está perdida
De tanto quererte.
No se si necesito
Tenerte o perderte.
Yo se que te he querido
Más de lo que he podido.
Quisiera amarte menos
Buscando el olvido,
Y en vez de amarte menos,
te quiero mucho más!

Entre dos que se quieren deveras
El cariño distinto ha de ser.
Mientras uno da entera su vida,
Otro sólo se deja querer.
Es verdad, y sin embargo no puedo
Conformarme con quererte yo.
Pido al cielo que pronto termine
Esta dura condena de amor."

por Chavela Vargas
(apesar de tudo, é mais ou menos isto...)

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Deste silêncio fundo desta mágoa


"Despojar-me ao teu lado no teu leito
deste silêncio fundo desta mágoa
de não ser mar imenso ao menos água
beijando o infinito do teu peito.

E sermos um ao menos por instantes
e fundirmos num só o nosso espanto
de esconjurar sonhos inquietantes
este momento amor que durou tanto.

Depois nunca estar só mesmo se ausente
estiveres dos meus olhos cada dia
mesmo se a voz da noite for dolente

se o desejo de ti for a corrente
que no teu o meu corpo principia.
Depois em cada sonho estares presente."

João Mattos e Silva

domingo, 27 de julho de 2008

E tenho um sorriso triste

"Dei-me inteiro.
Os outros fazem o mundo (ou crêem que fazem).
Eu sento-me na cancela,
sem nada de meu
e tenho um sorriso triste
e uma gota de ternura branda no olhar.
Dei-me inteiro.
Sobram-me coração, vísceras e um corpo.
Com isso vou vivendo."


Rui Knopfli

sábado, 26 de julho de 2008

O amor que só os olhos conhecem


"Quero escrever-te um poema que
tenha um sentido claro como o
que os teus olhos me disseram.

poderia ser um poema de amor,
tão breve como o instante em
que me deixaste ver os teus olhos.

mas o que os olhos dizem não cabe
num poema, nem eu sei como se diz
o amor que só os olhos conhecem."


Nuno Júdice

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Pleno e perfeito cada instante


"És tu a Primavera que eu esperava,
A vida multiplicada e brilhante,
Em que é pleno e perfeito cada instante!"

Sophia de Mello Breyner Andresen

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Nos jardins desertos da nossa solidão


"Perfil de primavera
Nas mãos que eu ergo acima desta ausência.
O meu sangue desperta, cria raizes no teu sangue
Nos jardins desertos da nossa solidão.
As minhas mãos, as tuas mãos, os corpos abraçados
E a única cidade construida para o nosso amor:
Nua, inquieta.
Clandestina.
A tua boca no meu peito. Os beijos
Demorados. E todos os silêncios.
As ruas que eu abri no teu olhar
Começam nos meus dedos.
Vem.
Eu amo-te."

Joaquim Pessoa

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Trago o terror


"Não se perdeu nenhuma coisa em mim.
Continuam as noites e os poentes
Que escorreram na casa e no jardim,
Continuam as vozes diferentes
Que intactas no meu ser estão suspensas.
Trago o terror e trago a claridade,
E através de todas as presenças
Caminho para a única unidade."



Sophia de Mello Breyner Andresen

terça-feira, 22 de julho de 2008

Sem voltar



"Tive um coração perdi-o
Ai quem mo dera encontrar!
Preso no fundo do rio
Ou afogado no mar!
Quem me dera ir embora
Ir embora sem voltar!
A morte que me namora...
Já me pode vir buscar!
Tive um coração...Perdi-o!
Ainda o vou encontrar
Preso no lodo do rio...
Ou afogado no mar!"

Amália Rodrigues por Cristina Branco, in 'Live'

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Caminho


Avanço sozinho pelo caminho que já foi nosso.
Passo a passo cresce a certeza da tua ausência e a dor de caminhar sem ti.
No horizonte apenas a esperança desse tempo que nos está destinado.
Eu acredito.

domingo, 20 de julho de 2008

Hoje, de mim, só resta o desencanto


"Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo ... e tudo errou...
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se enlaçou mas não voou...

Momentos de alma que, desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...

Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém..."

Mário de Sá-Carneiro, in 'Poemas Completos'


sábado, 19 de julho de 2008

Trago o teu fado


Trago teu fado guardado dentro do meu coração
Hei-de cantá-lo de noite e,
na hora mais sombria,
Hei-de cantá-lo ao vento,
como se este meu lamento fosse a voz da solidão

Trago o teu fado marcado nas profundezas da alma
Hei-de chorá-lo sozinho,
cantando pelo caminho,
A toda a gente que passa

Trago o teu fado escrito no brilho do meu olhar
Hei-de cantá-lo para sempre,
mesmo sabendo-te ausente,
Porque nasci para te amar.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

O teu destino


(...)
No café da praça em frente ao cais vi sobre as mesas
Uma disponibilidade transparente e nua
Que te pertence
O teu destino deveria ter passado neste porto
Onde tudo se torna impessoal e livre
Onde tudo é divino como convém ao real

Sophia de Mello Breyner Andresen

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Os olhos cansados de olhar para o além


"Eu sem você não tenho porquê, 
Porque sem você não sei nem chorar
Sou chama sem luz, jardim sem luar, 
Luar sem amor, amor sem se dar
E eu sem você sou só desamor 
Um barco sem mar, um campo sem flor
Tristeza que vai, tristeza que vem
Sem você meu amor eu não sou ninguém

Ah! que saudade 
Que vontade de ver renascer nossa vida
Volta querido 
Os meus braços precisam dos teus
Teus abraços precisam dos meus,
Estou tão sozinha 
Tenho os olhos cansados de olhar para o além
Vem ver a vida
Sem você meu amor eu não sou ninguém"

Vinícius de Moraes por Agnés Jaoui e Maria Bethânia, in 'Canta'

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Não posso olhar o céu sem me lembrar de ti!

"Lembras-te, meu amor das tardes outonais, em que íamos os dois, sozinhos, passear, para fora do povo alegre e dos casais, onde só Deus pudesse ouvir-nos conversar? Tu levavas, na mão, um lírio enamorado, e davas-me o teu braço; e eu triste, meditava na vida, em Deus, em ti… (...) Tudo, em volta de nós, tinha um aspecto de alma. Tudo era sentimento, amor e piedade. A folha que tombava era alma que subia… E, sob os nossos pés, a terra era saudade, a pedra comoção e o pó melancolia. Falavas duma estrela e deste bosque em flor; dos ceguinhos sem pão, dos pobres sem um manto. Em cada tua palavra, havia etérea dor; por isso, a tua voz me impressionava tanto! (...) Um raio de luar, entrando de improviso no meu quarto sombrio, onde medito, a sós, deixa, a tremer no ar, um pálido sorriso, um murmúrio de luz que lembra a tua voz. O Outono, que derrama ideal melancolia nas almas sem amor, nos troncos sem folhagem, deixa vibrar em mim saudosa melodia, dolorida canção, que lembra a tua imagem. A noite que escurece os vales e os outeiros, e que acende num bosque a voz do rouxinol e a estrela que protege e guia os pegureiros; a lágrima do céu ao ver morrer o sol, acorda, no meu peito, infinda e etérea dor, que à memória me traz a luz do teu olhar. Tudo de ti me fala, ó meu longínquo amor: as árvores, a névoa, os rouxinóis e o mar. Se passo por um lírio, às vezes, distraído, chama por mim, dizendo: "Oh! Não te esqueças dela!" Diz-mo também, chorando o vento dolorido. Diz-mo a fonte, a cantar, diz-mo, a brilhar, a estrela. E vejo, em toda a luz, teus olhos a fulgir. Como adivinho, em tudo, a alma que perdi! Não encontro uma flor, sem o teu nome ouvir. Não posso olhar o céu sem me lembrar de ti! Por isso, eu amo o pobre, o triste e a Natureza, a mãe da humana dor, da dor de Deus a filha. Meu coração, ao pé dum pobrezinho, reza; canta, ao lado dum ninho, ao pé da estrela, brilha. O meu amor por ti, meu bem, minha saudade, ampliou-se até Deus, os astros alcançou. Beijo o rochedo e a flor, a noite e a claridade. São estes, sobre o mundo, os beijos que te dou. Hás-de senti-los, sim, doce mulher de outrora. Ó roxo lírio de hoje, ó nuvem actual! Como dantes teu rosto, a rosa ainda hoje cora; beijo-te, sim, beijando a rosa virginal. Teu espectro divaga, ao longo dos espaços. Teu amor, feito luz, desce do Firmamento. Se abraço um verde tronco, eu sinto, entre os meus braços, teu corpo estremecer, como uma flor ao vento. Soluça a tua dor nas infinitas mágoas, que, no fumo da tarde, eu vejo, além, subir. E paira a tua voz no marulhar das águas, no murmúrio que sai das pétalas a abrir. Se os lábios vou molhar nas ondas duma fonte, queimam meu coração tuas lágrimas salgadas. E, quando acaricia o vento a minha fronte eu bem sinto, sobre ela, as tuas mãos sagradas. Quando a lua, no Outono, envolta em luz funérea, morta, vai a boiar nas águas do Infinito, doira meu frio rosto a palidez etérea, que dantes emanava o teu perfil bendito. Quando, em manhãs d`Abril, acordo, de repente, e vejo, no meu quarto, o sol entrar, sorrindo, julgo ver, ante mim, teu corpo resplendente, tua trança de luz, teu gesto suave e lindo. Descubro-te, mulher, na Natureza inteira, porque entendo a floresta, a névoa, o céu doirado, a estrela a arder, no Azul, a lenha, na lareira e o lírio que, na cruz do outono, está pregado. Falas comigo, sim, da dor, do bem, de Deus. (...) Todo eu medito e cismo. Um vago e etéreo laço prende-me ao teu imenso e livre coração, que abrange o mundo inteiro e ocupa todo o espaço, e que vai povoar a minha solidão. (...) Vivo a vida infinita, eterna, esplendorosa. Sou neblina, sou ave, Estrela, Azul sem fim, só porque, um dia, tu, mulher misteriosa, por acaso, talvez, olhaste para mim."

Teixeira de Pascoaes, in 'Elegia do Amor'

terça-feira, 15 de julho de 2008

Quando me lembra: esse sabor que tinha



"Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti..."


Florbela Espanca, por Inês Santos

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Se tudo é em vão

"Como poderia eu ter imaginação para te reconstituir na sólida delicadeza da tua fragilidade? (...) O amor e a morte inserem-se um no outro, deves saber. Mas eu sobrevivi e isso é uma condenação. Penso-te e o teu esplendor renasce-me no meu pensar e a minha idade retrai-se quando me apareces. E a eternidade em que se vive, mesmo se a velhice é real, restabelece-me igual a ti que nunca envelheceste. E não me perguntes porque te escrevo se tudo é em vão. Mas há o meu desejo de te fixar na palavra escrita que te diz, para ficares aí com o milagre que puder. É Primavera e tudo é nítido no seu ser real."

Vergílio Ferreira, in 'Cartas a Sandra'

domingo, 13 de julho de 2008

Se tu viesses


"(...)
A chuva embate com fúria contra as janelas, às rajadas do vento. Estou mais só, sem a passagem de mim para lá da vidraça. Se tu viesses. Ainda que trouxesses a tua pequena ruga de irritação. E se te sentasses aqui comigo à braseira a ouvir a tempestade. E eu te tomasse uma tua mão, abandonada e fria. E houvesse calor bastante em fitar o teu olhar. E soubesses como era bom eu olhar-te. E inventássemos a harmonia de estarmos assim um com o outro até sempre, a ouvir a chuva e o vento. E ficarmos assim em silêncio por já termos dito tudo."

Vergílio Ferreira, in 'Cartas a Sandra'

sábado, 12 de julho de 2008

Be forgot


"Should auld acquaintance be forgot,
And never brought to mind?
Should auld acquaintance be forgot,
And auld lang syne?

For auld lang syne, my dear,
For auld lang syne,
We'll tak a cup of kindness yet,
For auld lang syne!

And surely ye'll be your pint-stowp,
And surely I'll be mine,
And we'll tak a cup o kindness yet,
For auld lang syne!

We twa hae run about the braes,
And pou'd the gowans fine,
But we've wander'd monie a weary fit,
Sin auld lang syne.

We twa hae paidl'd in the burn
Frae morning sun till dine,
But seas between us braid hae roar'd
Sin auld lang syne.

And there's a hand my trusty fiere,
And gie's a hand o thine,
And we'll tak a right guid-willie waught,
For auld lang syne"


Música Tradicional escocesa por Mairi Campbell And Dave Francis




Significado das expressões:
auld lang syne - times gone by; be - pay for; braes - hills; braid - broad; burn - stream; dine - dinner time; fiere - friend; fit - foot; gowans - daisies; guid-willie waught - goodwill drink; monie - many; morning sun - noon; paidl't - paddled; pint-stowp - pint tankard; pou'd - pulled; twa - two

sexta-feira, 11 de julho de 2008

A força da tua ausência


És tu o segredo da minha solidão. Sinto a tua falta. Fecho os olhos e és tu quem vejo. Deito-me na nossa cama e é o teu corpo que procuro na escuridão. Faltas-me quando sorrio e os olhos não brilham. Faltas-me quando respiro e o ar não entra. Faltas-me quando o telefone toca e a voz do outro lado não é a tua. Faltas-me quando vejo passar os aviões no céu e não sei se és tu que estás lá dentro. Faltas-me quando procuro outros corpos e não encontro o teu corpo. Faltas-me quando, em silêncio, o meu coração bate mais forte ao pensar em ti. Faltas-me quando acordo sozinho e me obrigo a sair de casa para trabalhar. Faltas-me quando choro a tua ausência com a certeza de que tu não imaginas o que me fazes sofrer. Faltas-me quando penso que a luz de Lisboa não me serve de nada porque não estás comigo. Faltas-me quando este Verão me sabe a Inverno tal é a força da tua ausência.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Ou é de mim em ti, ou é de ti em mim


"Conheço o sal da tua pele seca
depois que o estio se volveu inverno
da carne repousando em suor nocturno.
Conheço o sal do leite que bebemos
quando das bocas se estreitavam lábios
e o coração no sexo palpitava.
Conheço o sal dos teus cabelos negros
ou louros ou cinzentos que se enrolam
neste dormir de brilhos azulados.
Conheço o sal que resta em minhas mãos
como nas praias o perfume fica
quando a maré desceu e se retrai.
Conheço o sal da tua boca, o sal
o sal da tua língua, o sal dos teus mamilos,
e o da cintura se encurvando das ancas.
A todo o sal conheço que é só teu,
ou é de mim em ti, ou é de ti em mim,
um cristalino pó de amantes enlaçados."

Jorge de Sena, in 'Conheço o Sal... E Os Outros Poemas' 

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Para que desista do desejo incessante


"Dá-me cinquenta razões para esquecer-te. Cinquenta razões para não mais perguntar por ti, nunca mais revolver-me em mórbida curiosidade. Para que desista do desejo incessante de saber das tuas voltas e revoltas, dos teus tiros e retiros, das tuas canções e redenções. Não, espera. Não me dês nada. Não mudemos a história. Deixa-te ficar sossegada, em casa, debaixo das mantas de Outono. Não quero que te canses. A partir de hoje, tudo o que pedir, pedi-lo-ei ao mundo. (...)"

Matilde Campilho, in 'O Dever de Um Homem' (Egoísta 50 - Junho de 2008)

terça-feira, 8 de julho de 2008

Desde a hora em que te vi

"(...)
Tenho o destino marcado
Desde a hora em que te vi
Ó meu amor adorado
Viver abraçada ao fado
Morrer abraçada a ti"

Júlio Dantas
(Porque é mesmo isso... Desde a hora em que te vi...)

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Então conformei-me.


"Pensava que uma das poucas qualidades que tinha era a ausência de inveja. Não é verdade. Invejo os poetas. O que eu queria mesmo, o que mais queria neste mundo, o que mais desejava mas não tenho talento, era ser poeta. Até aos dezanove, vinte anos, só escrevi poemas . Descobri que eram maus, que não era capaz, que me faltava o dom. Foi um achado tremendo para mim, a certeza que a minha vida perdera o sentido. E então, aflito, desesperado, a medo, comecei a tentar outra coisa, porque não me concebia sem uma caneta na mão. Nunca fiz contos, nem diários, nem teatro, nem ensaios e contar lérias não me interessava. Interessava-me transferir o mundo inteiro para o interior das capas de um livro. E cheio de hesitações, recuos, influências, a certeza que ainda não era aquilo, ainda não era aquilo, dei início a este fadário. Resignado com a minha ausência de talento para me exprimir em verso. Nos primeiros tempos ainda experimentei, ocasionalmente, redigi uns poemas: eram horríveis. Então conformei-me. (...) "

António Lobo Antunes, in 'Morto cobrido de amor'  na VISÃO de 3 de Julho de 2008

domingo, 6 de julho de 2008

Deslumbrar-me de luz o coração!


"Saudades! Sim... talvez... e porque não?...
Se o nosso sonho foi tão alto e forte
Que bem pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah! como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como pão!

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais a saudade andasse presa a mim!"
Florbela Espanca, in 'Poesia Completa'

sábado, 5 de julho de 2008

Que a saudade existe


"Ah, se eu te pudesse fazer entender
Sem teu amor eu não posso viver
E sem nós dois o que resta sou eu
Eu assim tão só
E eu preciso aprender a ser só
Poder dormir sem sentir teu calor
E ver que foi só um sonho e passou

Ah, o amor
Quando é demais ao findar leva a paz
Me entreguei sem pensar
Que a saudade existe e se vem
É tão triste, vê
Meus olhos choram a falta dos teus
Esses olhos que foram tão meus
Por Deus entenda que assim eu não vivo
Eu morro pensando no nosso amor

Por Deus entenda que assim eu não vivo
Eu morro pensando no nosso amor
Ah o amor
Quando é demais ao findar leva a paz
Me entreguei sem pensar
Que a saudade existe e se vem
É tão triste, vê
Meus olhos choram a falta dos teus
Esses olhos que foram tão meus
Por Deus entenda que assim eu não vivo
Eu morro pensando no nosso amor"

Por Elis Regina
(Porque a Rosa Passos cantou isto ontem e foi em ti que pensei ao ouvir esta música. E tive pena que não estivesses ali ao meu lado como era suposto.)

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Teu nome sussurrado


"Não te disse do amor. Nem tu disseste
da sedução vivida ou do desejo
dos nossos corpos e das nossas almas
naquele silêncio de palavras raras.

Não te disse do espanto. Ou do anseio
de ver em ti a luz reencontrada
no reverso do dia e seu contraste
em que perdidos acaso nos achámos.

Calámos as distâncias descompassos
dos nossos passos sós pelos caminhos
do amor sem ter amor que percorremos.

Mas a angústia ficou quando partiste
no silêncio de nós que o consentimos.
Teu nome sussurrado não esqueci."

João Mattos e Silva, in 'Marítimo Caminho'
(Porque não consigo mesmo esquecer-te e sussurro o teu nome muitas vezes (demais) para fingir que ainda estás aqui...)

quinta-feira, 3 de julho de 2008

A iludir a distância tão curta e tão longa


"Tinham 15 anos quando se apaixonaram e na memória de ambos ficou gravado aquele primeiro amor.
Ele era tão esperto e tão bonito, tinha uns olhos trocistas e um riso sempre adivinhado no traço da sua boca. Ela era tímida, tão tímida que os risos dele a atemorizavam, antes daquela ida ao cinema, ele a olhá-la em vez de ver o filme, a mão dele a procurar a mão dela, devagarinho, a deixar-se ficar ali, sem apertar, a evitar a recusa.
Ouviram juntos os discos que chegavam de Londres, aprenderam juntos a dançar nas festas em casa de uns e de outros, falavam das aulas, da escolha do curso e riam, riam perdidamente a imaginar-se adultos e sisudos.
Sentiram a descoberta da atracção física, um pequeno esboço, claro, mas ainda assim intenso e assustador, tudo contado e revivido em cartas ou falado em longas e sussurradas conversas ao telefone, a iludir a distância tão curta e tão longa. Não era fácil encontrarem-se e uns fugazes momentos a sós tinham que contar com a cumplicidade discreta dos amigos, era assim na altura e também tinha o seu encanto.
Nunca conversaram sobre aquele afastamento lento, insidioso, um ano é muito tempo para a impaciência de quem está a crescer. Só sabiam que um dia a carta não teve resposta, no outro o telefone não tocou, zangaram-se sem conversar, foi assim, ela tão tímida que não perguntou, ele tão esperto e bonito que não precisava de responder.
Quando se encontraram por acaso, muitos anos mais tarde, ele olhou-a com os mesmos olhos trocistas, o mesmo riso contido no traço da boca, e na sua voz ciciada de menino arriscou um “ainda temos muito que conversar”, mas ela riu-se e foi-se embora. Nunca mais seria tempo de conversarem.
Da vez seguinte que se encontraram ela não o reconheceu no homem grisalho e disforme que a olhou com uns olhos trocistas quando a cumprimentou com reserva. E ele, tão esperto, percebeu, e afastou-se, sem sombra de riso no traço da sua boca.
Ela lembrou-se de tudo isto quando foi buscar a cartas envelhecidas que ele lhe escrevera quando eram quase crianças e as leu, uma a uma, até lhe ouvir de novo a voz ciciada e o riso solto. No dia em que ele morreu."
Moura, in 'O.Insecto'

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Por um sorriso seu


"Você não sabe quanta coisa eu faria
Além do que já fiz
Você não sabe até onde eu chegaria
Pra te fazer feliz

Eu chegaria
Onde só chegam os pensamentos
Encontraria uma palavra que não existe
Pra te dizer nesse meu verso quase triste
Como é grande o meu amor

Você não sabe que os anseios do seu coração
São muito mais pra mim
Do que as razões que eu tenha
Pra dizer que não
E eu sempre digo sim
E ainda que a realidade me limite
A fantasia dos meus sonhos me permite
Que eu faça mais do que as loucuras
Que já fiz pra te fazer feliz

Você só sabe
Que eu te amo tanto
Mas na verdade
Meu amor não sabe o quanto
E se soubesse iria compreender
Razões que só quem ama assim pode entender

Você não sabe quanta coisa eu faria
Por um sorriso seu
Você não sabe
Até onde chegaria
Amor igual ao meu

Mas se preciso for
Eu faço muito mais
Mesmo que eu sofra
Ainda assim eu sou capaz
De muito mais
Do que as loucuras que já fiz
Pra te fazer feliz"

Roberto Carlos por Maria Bethânia, in 'As canções que você fez pra mim'
(Porque tu não sabes quantas coisas eu faria ou até onde eu chegaria para te fazer feliz...)

terça-feira, 1 de julho de 2008

Como un secreto

"Es verdad que nunca y siempre
son palabras que acostumbran
a repetir los amantes,
aunque tú nunca me has dicho
que vas a quererme siempre.
Solo has usado dos veces, 
en mi honor, como un secreto,
nunca esto, nunca aquello,
aunque tú no lo recuerdes
auque yo no lo repita,
ni otras cosas que yo he dicho,
por vuergüenza. Que el amor
que se siente un privilegio
se vuelve un poco ridículo
si sale mucho de casa."
Esther Morillas, in 'Mujeres'