Aproximei-me de ti; e tu, pegando-me na mão,
puxaste-me para os teus olhos
transparentes como o fundo do mar para os afogados. Depois, na rua,
ainda apanhámos o crepúsculo.
As luzes acendiam-se nos autocarros; um ar
diferente inundava a cidade. Sentei-me
nos degraus do cais, em silêncio.
Lembro-me do som dos teus passos,
uma respiração apressada, ou um princípio de lágrimas,
e a tua figura luminosa atravessando a praça
até desaparecer. Ainda ali fiquei algum tempo, isto é,
o tempo suficiente para me aperceber de que, sem estares ali,
continuavas ao meu lado. E ainda hoje me acompanha
essa doente sensação que
me deixaste como amada
recordação.
Nuno Júdice, in 'A Partilha dos Mitos'
2 comentários:
Muito simples, mas diz muito...
Andrea
Conhecia Nuno Júdice mas julgo nunca ter lido nada deste senhor até à minha última aula de Português, uma vez que foi este mesmo o poema que, na mesma, decidi analisar ao nível de temática, interpretação de recursos de retórica e afins. Não resisti a voltar a procurar lê-lo; sem dúvida, fantástico.
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