domingo, 18 de outubro de 2009

De certos encontros de acaso


"Nada do mundo mais próximo
mas aqueles a quem negamos a palavra
o amor, certas enfermidades, a presença mais pura
ouve o que diz a mulher vestida de sol
quando caminha no cimo das árvores
«a que distância da língua comum deixaste
o teu coração?»

A altura desesperada do azul
no teu retrato de adolescente há centenas de anos
a extinção dos lírios no jardim municipal
o mar desta baía em ruínas ou se quiseres
os sacos do supermercado que se expandem nas gavetas
as conversas ainda surpreendentemente escolares
soletradas em família
a fadiga da corrida domingueira pela mata
as senhas da lavandaria com um "não esquecer" fixado
o terror que temos
de certos encontros de acaso
porque deixamos de saber dos outros
coisas tão elementares
o próprio nome
Ouve o que diz a mulher vestida de sol
quando caminha no cimo das árvores
«a que distância deixaste
o coração?»"

José Tolentino Mendonça, in 'A Que Distância Deixaste o Coração'

1 comentário:

*** disse...

Talvez seja mais uma ofensa minha, uma triste associação, um daqueles atentados à arte, à Literatura e ao bom-senso;mas a ler este poema, não pude deixar de me lembrar desta musica.
Tu já sabes o que a casa gasta...
;)

http://www.youtube.com/watch?v=D1ECnQ5EOWg

Beijinho e perdoa a minha mundanice