sexta-feira, 20 de julho de 2007

Por me faltares

"— Amo como o amor ama.
Não sei razão pra amar-te mais que amar-te.
Que queres que te diga mais que te amo,
Se o que quero dizer-te é que te amo?
.....................................................................
Quando te falo, dói-me que respondas
Ao que te digo e não ao meu amor.
.....................................................................
Ah! não perguntes nada; antes me fala
De tal maneira, que, se eu fora surdo,
Te ouvisse todo com o coração.
Se te vejo não sei quem sou: eu amo.
Se me faltas [...] ...
Mas tu fazes, amor, por me faltares
Mesmo estando comigo, pois perguntas —
Quando é amar que deves. Se não amas,
Mostra-te indiferente, ou não me queiras,
Mas tu és como nunca ninguém foi,
Pois procuras o amor pra não amar,
E, se me buscas, é como se eu só fosse
Alguém pra te falar de quem tu amas. (...)
.....................................................................
Quando eu era pequeno, sinto que eu
Amava-te já longe, mas de longe...
.....................................................................
Amor, diz qualquer cousa que eu te sinta!
— Compreendo-te tanto que não sinto,
Oh coração exterior ao meu!
Fatalidade, filha do destino
E das leis que há no fundo deste mundo!
Que és tu a mim que eu compreenda ao ponto
De o sentir...?"
Fernando Pessoa in 'Primeiro Fausto'

2 comentários:

Anónimo disse...

XII
Montanhas, solidões [...], desertos todos,
[Inda] que assim eu tenha de morrer
Revelai-me a vossa alma, isso que faz
Que se me gele a mente ao perceber
Que realmente existis e, em verdade,
Que sois fato, existência, coisa, ser.
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Desespero ao ouvir-me assim dizer
Isso que n'alma tenho. Sinto-o, sinto-o,
E só falando não me compreendo.
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Sentir isto, eis o horror que não tem nome!
Mas senti-lo a sentir, intimamente,
Não com anseios ou suspiros d'alma
Mas com pavor supremo, com o gelado
Inerte horror da desesperação!


XIII
Não tenho, não, já dúvida ou alegria;
Mas nem regresso mais a essa dúvida
Nem a essa alegria regressava,
Se possível me fosse; tenho o orgulho
De ter chegado aqui, onde ninguém,
Nem nas asas do doido pensamento
Nem nas asas da louca fantasia,
Chegou. E aqui me quedo. Consolado
Nesta perene desconsolação.

in Fernando Pessoa "segundo tema"
N. Existo

Pedro Rapoula disse...

N. Existo,

obrigado pela companhia e pelas suas atentas escolhas.

Pedro