Dei por mim sentado no chão do quarto a contar as horas para que a noite caísse. Sabia que a noite nos traria a cumplicidade dos corpos... Era a cama o nosso território. Quando se passou aquele par de horas sem que aparecesses percebi que algo de trágico teria acontecido. Por isso quando o telefone tocou e me disseram que tinhas tido um desastre e estavas em coma, a notícia não causou em mim qualquer surpresa. Senti apenas o arrepio daqueles momentos em que nos apercebemos de que a vida não vai voltar a ser igual.
Cheguei ao hospital passado pouco tempo. A tua mãe já estava sentada na sala de espera, hirta, com uma expressão muito dura no rosto. Deixei-me ficar ao seu lado, em silêncio, sem perceber se devia pegar-lhe na mão e desejando ardentemente que ela me confortasse com umas festas. E ficámos ali os dois, numa tensão surda, as duas pessoas que mais te amavam à espera da confirmação da tua morte ou da tua salvação.
Quando o médico apareceu levantámo-nos os dois em menos de nada. A notícia de que a operação tinha corrido bem não foi sequer festejada porque a informação de que continuavas em coma deixou-nos completamente transidos de terror. Estavas agora num território só teu e apenas tu poderias encontrar o caminho de volta.
Nunca como naqueles dez dias que durou o teu coma eu senti tanto frio. Por mais que me agasalhasse estava constantemente gelado. Era o medo de te perder para sempre que me gelava a alma, o corpo, o coração. Era a certeza de que te amava que me deixava esmagado de desespero. E foram as recordações dos tempos felizes que me fizeram ultrapassar a tua perda. O fim é sempre mais trágico quando não o esperamos.
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