"Porque curiosamente, onde menos te encontro é onde tu exististe. Desprendeste-te donde estiveste e é em mim que mais me acontece tu estares. Mas nem sempre. Quantos dias se passam sem tu apareceres. E às vezes penso é bom que assim seja para eu aprender a estar só. Mas de outras vezes rompes-me pela vida dentro e eu quase sufoco da tua presença. Ouço-te dizer o meu nome e eu corro ao teu encontro e digo-te vai-te, vai-te embora. Por favor. E eu sinto-me logo tão infeliz. E digo-te não vás. Fica. Para sempre. Há em mim uma luta entre o desejo de que te esqueça e o de endoidecer contigo."
Vergílio Ferreira, in 'Cartas a Sandra'
4 comentários:
Diria que, mais do que "para aprender", seria "para me conformar a estar só"! Não há - como disse - meios caminhos. Nessas lutas hercúleas, perdemos, a maior parte das vezes, o desejo de ir em frente, de rasgar - na ambivalência terrífica de ter e não poder ou de não ter e querer -, na imensidão que nos assola, o medo de amar a todo o tempo, para que nos leve a muito mais!
É fantástico como imediatamente nos apercebemos disso, ao estar na presença de um génio. Essa capacidade de pensar o emocional e racionalmente exprimir o emotivo... bem como conseguir que, qual pedra num lago, recrie uma onda de emoções (e não apenas de pensamentos) no outro é pura e simplesmente divino. Ah, e o toque é, de um certo modo, ainda mais especial quando se trata de reviver emoçoes - encarar num texto no frio cibermundo algo com que nos identifiquemos. Conseguiste-o, Virgílio. Conseguiste-o, Pedro.
Apenas um soneto
Queria conhecer os teus segredos
e penetrar-te assim devassamente.
E ter tua vontade entre os meus dedos
e comandá-la assim seguramente.
Queria dizer - vem- e tu partires
ao meu encontro muito alegremente
e dizer-te - não venhas - e não vires
chorando um bem perdido eternamente.
Queria que me desses tão somente
um pouco da alvorada que há em ti
e a tua coerência incoerente.
Mas se apenas na noite se pressente
esses sinais dum tempo que perdi
que seja noite indefinidamente.
Com um abração
Que alegria saber que esteve no mundo um homem como Virgilio Ferreira.Que lindo o teu blog,Pedro.
Enviar um comentário