quinta-feira, 30 de abril de 2009

Mais



Hoy el mar es mas azul que el cielo...

José Manuel Capelo, por Ricardo Ribeiro (numa composição de João Gil)

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Levar-te-ei, sorrindo


"Levar-te-ei, sorrindo, pelo braço
até quando as palavras
não forem mais que sombras;
até quando as estátuas
se aborreçam da vida e pulverizem;
até quando os lagos
noivaram as nuvens e se puser o Sol.
Levar-te-ei, não esqueças,
até ao pôr-do-sol."

António Rebordão Navarro

terça-feira, 28 de abril de 2009

Neste dormir de brilhos azulados


"Conheço o sal da tua pele seca
depois que o estio se volveu inverno
da carne repousando em suor nocturno.

Conheço o sal do leite que bebemos
quando das bocas se estreitavam lábios
e o coração no sexo palpitava.

Conheço o sal dos teus cabelos negros
ou louros ou cinzentos que se enrolam
neste dormir de brilhos azulados.

Conheço o sal que resta em minha mãos
como nas praias o perfume fica
quando a maré desceu e se retrai.

Conheço o sal da tua boca, o sal
da tua língua, o sal de teus mamilos,
e o da cintura se encurvando de ancas.

A todo o sal conheço que é só teu,
ou é de mim em ti, ou é de ti em mim,
um cristalino pó de amantes enlaçados."

Jorge de Sena

segunda-feira, 27 de abril de 2009

A íntima chama de um fogo


"De ti e desta nuvem; desta nuvem
branca como voo de pássaro
em manhã de abril; de ti
e da íntima chama de um fogo
que não consente extinção;
de ti e de mim fazer um só acorde,
um acorde só; para não te perder. "

Eugénio de Andrade

domingo, 26 de abril de 2009

Para te ter e te amar


"Quando eu não te tinha
Amava a Natureza como um monge calmo a Cristo.
Agora amo a Natureza
Como um monge calmo à Virgem Maria,
Religiosamente, a meu modo, como dantes,
Mas de outra maneira mais comovida e próxima ...
Vejo melhor os rios quando vou contigo
Pelos campos até à beira dos rios;
Sentado a teu lado reparando nas nuvens
Reparo nelas melhor —
Tu não me tiraste a Natureza ...
Tu mudaste a Natureza ...
Trouxeste-me a Natureza para o pé de mim,
Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma,
Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,
Por tu me escolheres para te ter e te amar,
Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente
Sobre todas as cousas.
Não me arrependo do que fui outrora
Porque ainda o sou."

Alberto Caeiro

sábado, 25 de abril de 2009

Só hoje soube o verdadeiro valor do vento


"Está hoje um dia de vento e eu gosto do vento
O vento tem entrado nos meus versos de todas as maneiras e
Só entram nos meus versos as coisas de que gosto
O vento das árvores o vento dos cabelos
O vento do inverno o vento do verão
O vento é o melhor veículo que conheço
Só ele traz o perfume das flores só ele traz
A música que jaz à beira-mar em agosto
Mas só hoje soube o verdadeiro valor do vento
O vento actualmente vale oitenta escudos
Partiu-se o vidro grande da janela do meu quarto."

Ruy Belo

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Nos teus segredos



"Meu amor corre-me o corpo
Com beijos soltos nos dedos
Que as sombras da tua pele
Aprendam os meus segredos.

Meu amor corro-te o corpo
Com beijos soltos dos dedos
Que as sombras da minha pele
Naveguem nos teus segredos

Meu amor corre-me o corpo
Com beijos soltos pelos dedos
Que as sombras da minha pele
Se soltem dos teus segredos"


Circe, in Ulisses de Cristina Branco

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Dentro da eternidade


"Amo-te tanto meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te enfim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude."

Vinicius de Morais
(3 meses)

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Ser teu


"Estou cansado
Quero dormir nos teus braços,
por um instante ser teu
Em pensamentos — a espaços,
acredito que em teus braços
encontro o Outro no céu"

João Monge

terça-feira, 21 de abril de 2009

Um desejo por esquecer


"Tudo parece inteiro
vindo de tão longe
presentes de regresso
à beira dos teus olhos
dois sóis quase extintos
em esperança sem pontaria
na partida da adolescência
pediste com as duas mãos
uma das minhas sempre frias
julgando assim conseguir
descrever um adeus
sem choro nem piedade
nos teus beijos de mãos
abertas na minha cara
por ti a distinguir o traçado
da beleza na pele branca
um desejo por esquecer
que nunca esteve perdido
no lastro de dois corações
o sustento e a musicalidade
a alegria que desmancha a dor
na intensidade de um fado
que se cumpriu a si mesmo
aqui na terra como no céu...

- Amor, finalmente, chegaste! - "

Aldina Duarte

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Já não posso andar só


"O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio."


Alberto Caeiro

domingo, 19 de abril de 2009

O amor do teu encanto


"Amo-te muito, meu amor, e tanto
que, ao ter-te, amo-te mais, e mais ainda
depois de ter-te, meu amor. Não finda
com o próprio amor o amor do teu encanto.

Que encanto é o teu? Se continua enquanto
sofro a traição dos que, viscosos, prendem,
por uma paz da guerra a que se vendem,
a pura liberdade do meu canto,

um cântico da terra e do seu povo,
nesta invenção da humanidade inteira
que a cada instante há que inventar de novo,

tão quase é coisa ou sucessão que passa...
Que encanto é o teu? Deitado à tua beira,
sei que se rasga, eterno, o véu da Graça."

Jorge de Sena

sábado, 18 de abril de 2009

Onde está o que sonho


"Todos os dias agora acordo com alegria e pena.
Antigamente acordava sem sensação nenhuma; acordava.
Tenho alegria e pena porque perco o que sonho
E posso estar na realidade onde está o que sonho.
Não sei o que hei de fazer das minhas sensações.
Não sei o que hei de ser comigo sozinho.
Quero que ela me diga qualquer cousa para eu acordar de novo."

Alberto Caeiro

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Do teu sereno olhar


"De mais ninguém, senão de ti, preciso:
Do teu sereno olhar, do teu sorriso,
Da tua mão pousada no meu ombro.
Ouvir-te murmurar: - «Espera e confia!»
E sentir converter-se em harmonia,
O que era, dantes, confusão e assombro."

quinta-feira, 16 de abril de 2009

O teu nome


"Esta manhã encontrei o teu nome nos meus sonhos
e o teu perfume a transpirar na minha pele. E o corpo
doeu-me onde antes os teus dedos foram aves
de verão e a tua boca deixou um rasto de canções.

No abrigo da noite, soubeste ser o vento na minha
camisola; e eu despi-a para ti, a dar-te um coração
que era o resto da vida - como um peixe respira
na rede mais exausta. Nem mesmo à despedida

foram os gestos contundentes: tudo o que vem de ti
é um poema. Contudo, ao acordar, a solidão sulcara
um vale nos cobertores e o meu corpo era de novo
um trilho abandonado na paisagem. Sentei-me na cama

e repeti devagar o teu nome, o nome dos meus sonhos,
mas as sílabas caíam no fim das palavras, a dor esgota
as forças, são frios os batentes nas portas da manhã."


Maria do Rosário Pedreira

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Quando o amor chegou


"O corpo não espera. Não. Por nós ou pelo amor. Este pousar de mãos, tão reticente e que interroga a sós a tépida secura acetinada, a que palpita por adivinhada em solitários movimentos vãos; este pousar em que não estamos nós, mas uma sêde, uma memória, tudo o que sabemos de tocar desnudo o corpo que não espera; este pousar que não conhece, nada vê, nem nada ousa temer no seu temor agudo...

Tem tanta pressa o corpo! E já passou, quando um de nós ou quando o amor chegou."

Jorge de Sena

terça-feira, 14 de abril de 2009

Cumprindo o seu destino


"Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma
espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Ás vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a
olhar, para poder vê-las assim."
Cecília Meireles

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Puro


"Está tão puro já meu coração,
que é o mesmo que morra
ou cante."


Juan Ramón Jiménez

domingo, 12 de abril de 2009

Súbitos momentos


"Contigo aprendi coisas tão simples como
a forma de convívio com o meu cabelo ralo
e a diversa cor que há nos olhos das pessoas
Só tu me acompanhastes súbitos momentos
quando tudo ruía ao meu redor
e me sentia só e no cabo do mundo
Contigo fui cruel no dia a dia
mais que mulher tu és já a minha única viúva
Não posso dar-te mais do te dou
este molhado olhar de homem que morre
e se comove ao ver-te assim presente tão subitamente"


Ruy Belo

sábado, 11 de abril de 2009

Sem disfarce


"Não me peças palavras, nem baladas,
Nem expressões, nem alma... Abre-me o seio,
Deixa cair as pálpebras pesadas,
E entre os seios me apertes sem receio.

Na tua boca sob a minha, ao meio,
Nossas línguas se busquem, desvairadas...
E que os meus flancos nus vibrem no enleio
Das tuas pernas ágeis e delgadas.

E em duas bocas uma língua..., - unidos,
Nós trocaremos beijos e gemidos,
Sentindo o nosso sangue misturar-se.

Depois... - abre os teus olhos, minha amada!
Enterra-os bem nos meus; não digas nada...
Deixa a Vida exprimir-se sem disfarce!"


José Régio

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Tesouro


"O meu tesouro és tu
eternamente tu
não há passos divergentes
para quem se quer encontrar..."

Jorge Palma

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Dentro de mim estou completo


"Vai alta no céu a lua da Primavera
Penso em ti e dentro de mim estou completo.
Corre pelos vagos campos até mim uma brisa ligeira.
Penso em ti, murmuro o teu nome; e não sou eu: sou feliz.
Amanhã virás, andarás comigo a colher flores pelo campo,
E eu andarei contigo pelos campos ver-te colher flores.
Eu já te vejo amanhã a colher flores comigo pelos campos,
Pois quando vieres amanhã e andares comigo no campo a colher flores,
Isso será uma alegria e uma verdade para mim."


Alberto Caeiro

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Belo


"C'est à cause que tout doit finir que tout est si beau."

("É por tudo ter de acabar que tudo é tão belo")
Charles Ferdinand Ramuz, in 'Adieu à beaucoup de personnages et autres morceaux '


terça-feira, 7 de abril de 2009

Ao teu pensar-me querendo-te...


"Morde-me com o querer-me que tens nos olhos
Despe-te em sonho ante o sonhares-me vendo-te,
Dá-te vária, dá sonhos de ti-própria aos molhos
Ao teu pensar-me querendo-te...

Desfolha sonhos teus de dando-te variamente,
Ó perversa, sobre o êxtase da atenção
Que tu em sonhos dás-me... E o teu sonho de mim é quente
No teu olhar absorto ou em abstracção...

Possue-me-te, seja eu em ti meu spasmo e um rocio
De voluptuosos eus na tua coroa de rainha...
Meu amor será o sair de mim do teu ocio
E eu nunca serei teu, ó apenas-minha?"


Fernando Pessoa

segunda-feira, 6 de abril de 2009

E vivo só p'ra te amar



"Eu quero morrer de amores como os rios morrem no mar
Campos inteiros de flores não chegam pra me deitar
Eu quero morrer de amores como os rios morrem no mar

Eu quero o pranto das rosas nas bocas que desfolhei
Perdi todas as demoras, perdi e não me encontrei
Eu quero o pranto das rosas nas bocas que desfolhei

Meu grande amor, meu sorriso de amargura
Nasce a luz na noite escura quando vens para me abraçar
Ó meu amor rasga essa dor e sorri
Eu não sei viver sem ti e vivo só p'ra te amar

Eu quero mais que ninguém o silêncio, a solidão
Eu queria ser mais além, sabor amargo a limão
Eu quero mais que ninguém o silêncio, a solidão

Mas não serei o navio que se verga à tempestade
Nas margens de um novo rio cantarei a liberdade
Nas margens de um novo rio cantarei a liberdade

Meu grande amor, meu sorriso de amargura
Nasce a luz na noite escura quando vens para me abraçar
Ó meu amor rasga essa dor e sorri
Eu não sei viver sem ti e vivo só p'ra te amar"

Paulo Valentim por Katia Guerreiro, in 'Fado'

domingo, 5 de abril de 2009

Que silêncio é este


"Há um silêncio pesado que não sei de onde é que vem
Nem sei se lhe chamam fado ou que outro nome é que tem
Se canto, não me dói tanto o coração magoado
Mas há em tudo o que canto este silêncio pesado

Não é mágoa nem saudade nem é pena de ninguém
O silêncio que me invade e não sei de onde é que vem
Silêncio que anda comigo e que mesmo sem eu querer
Diz através do que eu digo o que eu não posso dizer

Este silêncio pesado que me suspende e sustém
Não sei se lhe chamam fado ou que outro nome é que tem
Se com palavras se veste a alegria e pranto
Então que silêncio é este que há em tudo o que eu canto"


Manuela de Freitas

sábado, 4 de abril de 2009

You made me forget myself



"Just a perfect day drink sangria in the park
And then later when it gets dark we go home
Just a perfect day feed animals in the zoo
Then later a movie too
and then home
Oh, it's such a perfect day
I'm glad I spent it with you
Oh, such a perfect day
You just keep me hanging on you just keep me hanging on
Just a perfect day
problems all left alone
Weekenders on our own it's such fun
Just a perfect day
you made me forget myself
I thought I was someone else someone good
Oh, it's such a perfect day I'm glad I spent it with you
Oh, such a perfect day
You just keep me hanging on
you just keep me hanging on
You're going to reap just what you sow
You're going to reap just what you sow
You're going to reap just what you sow
You're going to reap just what you sow"
Lou Reed

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Os erros do que fui


"Deixei atrás os erros do que fui
Deixei atrás os erros do que quis
E que não pude haver porque a hora flui
E ninguém é exacto nem feliz.

Tudo isso como o lixo da viagem
Deixei nas circunstâncias do caminho,
No episódio que fui e na paragem,
No desvio que foi cada vizinho.

Deixei tudo isso, como quem se tapa
Por viajar com uma capa sua,
E a certa altura se desfaz da capa
E atira com a capa para a rua."

Fernando Pessoa

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Where the clouds are far behind




"Somewhere over the rainbow
Way up high
There's a land that I heard of once in a lullaby

Somewhere over the rainbow
Skies are blue
And the dreams that you dare to dream really do come true

Someday I'll wish upon a star
And wake up where the clouds are far behind me
Where troubles melt like lemon drops
A way above the chimney tops
That's where you'll find me

Somewhere over the rainbow
Blue birds fly
Birds fly over the rainbow
Why then oh why can't I?

If happy little blue birds fly beyond the rainbow
Why oh why can't I? "

Para a minha querida Denisa, que está a passar o pior momento da sua vida.
Estou ao teu lado neste momento de dor.
Conta sempre comigo.